--Ministro, o senhor não tem receio de o seu projeto de reinstituição da escravatura ser rejeitado no Congresso, já que se trata de emenda à Constituição?
--Pelo amor de Deus! Não apoiar isso é antipatriótico demais! É coisa de quem não quer ver o Brasil crescer!
--Mas sinistro, desculpe(!), ministro, o senhor não acha que há o risco de ser rejeitado por questões humanísticas?
--Isso que você tá falando é coisa de comunista. Não há nada de desumano na escravidão.
--O senhor acha isso economicamente viável, já que a escravidão foi abolida no mundo por uma demanda de mão-de-obra assalariada para consumir os produtos industrializados dos países do Primeiro Mundo, movimento liderado pela Inglaterra a partir da Revolução Industrial, justamente pra movimentar a economia?
--Mas esse modelo, como você vê, não deu certo aqui.
--Não, ministro??????
--Ué?! Você não tá vendo o resultado? As empresas estão com dificuldades de pagar seus compromissos e operando com receita reduzida.
--Mas o senhor não atribuiria esse quadro à queda do consumo por conta do desemprego gerado pela pandemia?
--Isso aí é uma outra história. Pandemia é área da Saúde, onde temos uma excelente gestão do ministro Ednardo Pesadelo, que sabe mais do que muito médico por aí.
--Mas ministro...
--Eu só espero que a oposição não obstrua as sessões, colocando-se contra os interesses mais legítimos da nação, porque o presidente Umbigo Maia já disse que é totalmente favorável, e hoje o presidente Jandir Trumpófilo-Naro conta com o apoio dos político de bom-senso do Meião, e o projeto irá a votação em regime de urgência.
--O senhor pretende recriar as senzalas?
--Disso não há necessidade, porque existe fartura de mão-de-obra no mercado, o que faz desnecessário que se suprima a liberdade. Estamos num momento muito favorável, pois hoje quem quer trabalhar sabe que comer é mais importante do que a liberdade, e assim não há razão pra ninguém fugir. A grandeza dessa PEC é que teremos escravos com liberdade. Além disso, a construção de alojamentos oneraria por demais os empregadores.
--Ministro, como esses trabalhadores irão se alimentar?
--Ora, isso é óbvio! Eu acabei de responder! Cada empresário terá de arcar com a alimentação de seus empregados, já que todos estes estarão disponíveis para seus patrões 24 horas por dia. Vê como isso é um projeto social de alta envergadura, em que o detentor do meio de produção não tem como se desincumbir do sustento alimentar do seu laborador?
--E os filhos desses trabalhadores? Como farão pra terem o que comer?
--Ora, o dono de empresa ter de alimentar filhos de seus trabalhadores é o fim da picada!
--Mas são crianças e...
--O presidente da República já disse que no seu tempo nada tinha de mais uma criança trabalhar e ter o seu dinheirinho pra ajudar a família...
--Mas no caso o trabalho é gratuito, ministro!
--Isso é apenas um mero detalhe, no qual não vejo nenhuma relevância...
--Mas se a criança for de berço...?
--Não é hora de conjeturar, e sim de lutar pelo que é melhor pro país! Isso que você disse é de competência do Ministério da Criança!
--Mas, ministro, não temos o Ministério da Criança aqui...
--Pois é! Isso já é uma questão que você deve tratar com o nosso chefe de Governo: quem sabe ele não acata a ideia?
--Agora, ministro, mudando de assunto, o senhor não concorda que a política ambiental do sinistro, digo, ministro Boiadeiro Salles pode tornar crítica a situação dos nossos exportadores, que a economia sofrerá retração ainda maior por conta da não-aceitação dos nossos produtos na União Europeia?
--Ué? Dentro da sua casa você pode queimar o Pantanal, a Mata Atlântica e a Floresta Amazônica que bem quiser.
Barão da Mata
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